quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O BBB e o cordel

Recebi um emeio essa semana de uma professora de arte-educação. Tratava-se de um cordel cujo tema é, no mínimo, perturbador: Big Brother Brasil, um programa imbecil. Constava o endereço do blogue de seu autor. Decidi ver o blogue e observar alguns comentários.

Realmente o texto é o que o título dá a entender – um ataque feroz ao BBB. Como não assisto ao programa (aliás, não o suporto), não posso nem afirmar nem denegar alguns dos ataques a ele feitos no cordel (coisas relativas propriamente ao programa), mas posso, e isso farei, analisar alguns pontos que considero críticos na análise feita por seu autor.

Em primeiro lugar, o autor ainda trabalha com a noção de alienação, sem problematizá-lo: “Que além de alienar / Vai por certo atrofiar / A mente do brasileiro.” Não estou aqui dizendo que não existem pessoas alienadas, mas fico a me perguntar se essa alienação não é, de certa forma, voluntária. Não tenho a pretensão de ter a resposta a essa questão, mas aí vai ela: Não seria possível, ao invés de considerar a população como vítimas do BBB, tal qual faz o cordelista, pensá-la como tomando de maneira consciente a decisão de assistir a esse programa? Nesse caso, o problema seria pensar o porquê dessa escolha, sem necessariamente condená-la.

Outra noção também bastante problemática é a de evolução. Parte de uma visão muito linear da história e da educação (“Me refiro ao brasileiro / Que está em formação / E precisa evoluir / Através da Educação”). E ainda levanta outra questão: Só a evolução que ele pretende é boa? Não pode haver outras formas de evolução? Bem entendido: não trabalho com a idéia de evolução.

Outro problema: o autor diz que a família está longe da realidade, ao assistir ao BBB. Pois bem, é preciso esclarecer a idéia de realidade presente nessa afirmação. A que realidade ele se refere? Não há realidade em um grupo de pessoas se isolarem numa casa? Embora esse não seja a idéia exata de realidade com que trabalho, essas pessoas não estão realmente lá? E isso, quer queiramos quer não, não faz parte de nossa realidade? Se o cordelista deseja que outra realidade seja observada, pois bem, mas daí a dizer que essas pessoas estão fora da realidade, vai uma boa caminhada.

Agora, o que me parece uma demonstração muito evidente de sentimento de superioridade:

“Se a intenção da Globo
É de nos “emburrecer”
Deixando o povo demente
Refém do seu poder:
Pois saiba que a exceção
(Amantes da educação)
Vai contestar a valer.”

Parece-me muita pretensão querer considerar que a maioria é burra e demente e que uma pequena elite intelectual precisa tomar as rédeas da situação e resolvê-la.

Eu acho que já ficou claro em vários textos desse blogue que não morro de amores pela Rede Globo. E reafirmo que não suporto o programa em questão. Mas não se pode basear uma crítica em argumentos tão pouco válidos. Aliás, a posição em que o autor (intencionalmente, ou não) acaba se colocando é bastante parecida com a posição em que a própria Globo se coloca: como detentor de um saber – logo, de um poder – e como superior aos mortais que, emburrecidos, não podem decidir o que querem ver, apenas deglutem o que lhes é ofertado. Não sou assim, da mesma forma que acredito que o autor do cordel em questão não seja, mas, diferentemente dele, não acho lá muito humilde nem realista pensar que todas as outras pessoas sejam.

Se quiserem ler todo o cordel o endereço é:

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Ajuda aos haitianos

Tenho acompanhado, confesso que com um pouco de preocupação, as notícias relativas ao auxílio prestado às vítimas do terremoto no Haiti. Por exemplo, vi as matérias sobre a demora em se distribuir alimento às vítimas. Segundo o responsável pelo armazém da ONU, a organização ainda não tinha dado a ordem de iniciar a distribuição. Entendo que é necessária uma efetiva organização para atender a tantas pessoas necessitadas. Mas acredito que também é necessária uma efetiva rapidez na prestação de ajuda aos afetados pelo terremoto.

Sobre isso, destaco o que observei no site de notícias das Testemunhas de Jeová (www.jw-media.org site em inglês) a respeito de como elas têm feito para ajudar seus adeptos e outros. Diz-se que no dia seguinte ao desastre, já havia ajuda humanitária disponível. Um dos seus Salões de Assembléias está, inclusive, funcionando como hospital para atender aos feridos. Curioso é que, diferentemente da ONU e dos países a ela afiliados, que dizem ser aptos a socorrer as pessoas neste tipo de desastre, as Testemunhas não afirmam ser uma instituição de ajuda humanitária, mas uma instituição religiosa que, quando necessário, presta esse tipo de serviço.

O que quero dizer é que, na medida em que a ONU e outros países se preocupam com problemas de logística, essa organização, repito, de cunho eminentemente religioso tem organizado ação efetiva em prol das pessoas naquela região. Parece-me que, de alguma forma, os problemas logísticos não são tão grandes assim para eles. É algo que, no mínimo dá o que pensar: a quantas anda a organização da Organização das Nações Unidas? Tem ela realmente cumprido o que está proposto em seu estatuto? Parece que a resposta é não.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

(DES)ENGANOS EM SÉRIE

Semana passada, assisti a um episódio do documentário seriado Lutas.doc, exibido pela TV Brasil. O assunto girou em torno de como a televisão acomoda as pessoas com relação a sua própria condição social. Várias personalidades deram sua opinião e todas elas pareceram concordar em alguns pontos: a televisão é enganosa, não mostra a realidade e, do modo como é feita contemporaneamente, é nociva.

É claro que a TV, do modo como se apresenta, está longe de me agradar, conforme mostram os outros textos desse blogue. Mas pareceu-me que muito mais enganosa que a televisão são as bases em que foram desenvolvidas as críticas feitas no documentário. Vejamos, então: vamos pensar na noção de realidade.

Muitas tentativas foram feitas de se responder à questão básica: “O que é realidade?” Entretanto, parece-me um grande engano considerar o que chamo de “realidade real”, também chamado “realidade objetiva” (o que acarretaria outros problemas: o que é objetividade? É ela possível), como a única realidade possível, ou como a única realidade que realmente importa. Por que, afinal de contas, nem mesmo essa realidade pode se dar a conhecer sem as ficcionalizações proporcionadas pelos nossos sentidos. Explico: todo mundo já ouviu falar em ilusão de ótica. Pois bem, esse é talvez o exemplo mais claro para demonstrar que nossos sentidos não dão conta da realidade como ela é, mas que eles mesmos são formas de ficcionalizar uma realidade. Pensar nesses termos desloca a importância da realidade dita objetiva. (É claro que a questão vai muito além do que expus acima. Mas acredito que, para um texto curto como esse, sejam suficientes essas considerações.)

Daí, surge a pergunta: como se poderia mostrar “a realidade” através da TV, um meio de comunicação que está repleto de ficcionalizações? Se a câmera é posicionada desta ou daquela forma, pode resultar em diferentes interpretações do mesmo fato. Depois há o diretor, o editor, os apresentadores, os atores, cada qual com suas próprias ficcionalizações – intencionais ou não. E, por fim, há as ficcionalizações dos telespectadores. O conceito de realidade se dilui e não faz mais sentido.

Não quero com isso dizer que se deve aceitar a TV como está. Mas as nossas críticas precisam estar bem fundadas, e não ser baseadas em chavões como “Hollywood está se especializando em fazer o mesmo filme, a história sempre se repete” ou “a televisão provoca uma alienação nas pessoas” ou, pior ainda, “as pessoas precisam ser ajudadas...”. Talvez fosse mais interessante pensar em como a televisão engendra novas formas de pensar ou como ela se adequa a esses novos modelos de pensamento, em que o interesse se volta quase que exclusivamente para realidade ficcional. E daí pensar nos efeitos disso na sociedade e no homem. Aí, sim, talvez possamos tentar pensar em como trazer esse interesse para outras realidades. Mesmo assim ainda fica a pergunta: Para quê?