sábado, 25 de outubro de 2008

TV Xuxa e a perpetuação de estereótipos

Infeliz. Eis como considero a apresentação da dupla "As absorventes" no concurso de paródias da "Tv Xuxa" do sábado, 4 de outubro de 2008. Como foi exaustivamente repetido após a apresentação das meninas, elas são boas comediantes. A paródia foi bem feita. A intenção da apresentação foi humorística. E elas são excelentes atrizes.Mas não posso deixar de fazer uma ressalva, aliás, da maior pertinência: a repetição de estereótipos com respeito à representação do negro. Uma das garotas aparece pintada de preto, com a boca excessivamente vermelha e uma peruca de cabelos desgrenhados. É a síntese da ridícula representação do negro perpetrada e perpetuada no decorrer dos séculos. Esse tipo de figura negra padroniza e coisifica a etnia. Foi uma escolha muito infeliz, mas que talvez revele um imaginário que perpassa nossa mente e nosso discurso e talvez nem percebamos.

Para piorar ainda mais as coisas, acrescento à minha análise dois elementos: a representação masculina e a própria paródia. Pensando tudo isso como um único conjunto, temos uma negra (estereotipada até o limite, conforme explanei acima) sendo detratada e tendo atribuídas a si características negativas (odores desagradáveis nas axilas, flatos) por um homem de pele clara. Em outras palavras, a mulher negra sendo maltratada pelo homem branco. Não sei, mas isso se parece muito com uma situação que deveria ter sido extinta em 13 de maio de 1888. Vimos ainda, em resultado da escolha dos personagens a ser representados, o homem branco como aquele que traz "civilidade" (é ele quem aconselha: use talco pra chulé). E mais uma vez todas as qualidades negativas são atribuídas ao negro.

Destaco também o paulatino apagamento da voz feminina e negra. Não lhe é dado falar, pois sua voz não tem importância, o que apenas reforça o processo de coisificação, já aludido. A fala pertence apenas à representação masculina e branca. Não há direito de defesa. Em certo sentido, ainda bem, já que, se considerarmos o conjunto, a única representação verbal que poderíamos esperar da personagem negra seria o caricatural português "estropiado", cheio de sons guturais, como é comum em estereótipos desse tipo.

Não pretendo listar aqui medidas que desagravariam a apresentação das "absorventes", que a tornariam menos problemática. Ressalto, porém, que a repetição desse tipo de representação num programa infanto-juvenil em pleno sábado de manhã apenas ajuda a perpetuar nas mentes de crianças e pré-adolescentes estereótipos e preconceitos que, na verdade, nos cumpre extirpar. A emissora demonstra, assim, sua falta de engajamento com movimentos que não são recentes e que ganham cada vez mais força, no sentido de retirar pechas da imagem tanto do negro quanto da mulher.

Um comentário:

Ms. Urpia disse...

Leandro,

como já lhe disse pessoalmente e através de e-mail, sou FÃ do seu texto e das questões elucidativas que você aborda de forma tão direta e esclarecedora. Parabéns!!!
Há uma pequena correção a ser feita: 13 de maio de 1888.

Com carinho,

Adriana Urpia.